Em dezembro de 2020, iniciou-se o ajuizamento de dezenas de ações judiciais em face da Fazenda do Estado de São Paulo, com o objetivo de manter a isenção do IPVA das pessoas com deficiência que perderiam o benefício fiscal, em razão da Lei 17.293/20, que alterou o inciso III do artigo 13 da Lei 13.296,08.
Em 01 janeiro de 2021, a Fazenda, conforme já esperado, lançou o imposto no sistema, revogando, portanto, a isenção de milhares de pessoas com deficiência, exceto daquelas que haviam conseguido uma liminar na justiça impedindo a cobrança do IPVA.
O Ministério Público, concomitantemente às ações individuais ajuizadas, ingressou com uma ação civil pública, requerendo, em síntese, a suspensão da cobrança do IPVA até que a Fazenda estadual faça a reanálise do recadastramento obedecendo os princípios constitucionais.
Em sede de agravo de instrumento, o pedido foi deferido, sendo as cobranças suspensas pelo fisco – contudo, esta situação é reversível e, tão logo seja feita a reanálise dos casos, tal como pleiteado pelo MP, o IPVA será lançado em desfavor daqueles que, em 2020, eram isentos.
Por essa razão, as ações individuais são de suma importância. Recentemente, as sentenças começaram a ser proferidas. Diversas foram as decisões favoráveis à classe PcD, mas, no dia 29/05/2021, pode-se dizer que, de fato, houve uma vitória em caráter (quase) definitivo, uma vez que ainda que cabe recurso ao STF.
O juízo de primeiro grau, da cidade de Santo André, preferiu uma brilhante sentença, fundamentando-a da seguinte maneira:
Inicialmente, diz que o lançamento do imposto para o exercício de 2021 é ilegal e viola o princípio constitucional da anterioridade tributária, previsto no artigo 150, inciso III, da Constituição Federal.
Além disso, assevera que foi criada uma distinção entre os deficientes não condutores e os deficientes graves/severos condutores e, entre estes, a distinção de que não estariam mais isentos da cobrança de IPVA os que não tiverem veículos adaptados (os que contenham, por exemplo, apenas câmbio automático e direção hidráulica/elétrica de fábrica).
Afirma que tal distinção fere, também, o princípio da isonomia tributária, tratando como fato gerador da tributação ou da isenção não a condição vulnerável do contribuinte deficiente, mas o tipo de adaptação implementada no veículo.
O nobre julgador ressalta que a isonomia tributária configura norma de inclusão social, estando ligada, indissociavelmente, ao princípio da dignidade humana (artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal), o que constitui limitação constitucional ao poder de tributar.
A fazenda recorreu, e a 2ª Turma Recursal do Colégio Recursal de Santo André, manteve a acertada sentença, sob o argumento de que a nova condição para a obtenção da isenção do IPVA, qual seja, necessidade de adaptação veicular, cria indevida e inadmissível discriminação entre as pessoas com deficiência, tratando-as de forma desigual, em manifesta afronta aos princípios constitucionais da isonomia e da dignidade da pessoa humana.
Portanto, tanto em primeira, quanto em segunda instância, a Fazenda do Estado foi derrotada, sendo a vitória conferida aos autores, pessoas com deficiência que foram atingidas negativamente pela alteração legislativa, mas que na justiça conseguiram reverter a situação, sendo o benefício fiscal mantido.
FONTE: TJSP. PROCESSO 1001644-16.2021.8.26.0554.