Muitos motoristas, durante a pandemia, foram autuados pela recusa ao teste do bafômetro indevidamente, ao nosso ver, porquanto em muitos dos casos a recusa foi legítima e se deu somente pela falta de confiabilidade com relação ao risco de transmissão do covid-19 por meio do equipamento, já que o teste exige o contato com a boca/saliva, inexistindo meios seguros para se certificar que o etilômetro está adequadamente higienizado.
Apesar de não terem apresentado uma justificativa, acredita-se que seja por essa razão que a Polícia Rodoviária Federal havia restringido o uso do bafômetro, dado o perigo de transmissão e disseminação do vírus. Existe um consenso de que não é suficiente a substituição do bocal para garantia de um teste seguro, porque gotículas de saliva podem se alojar no interior do equipamento.
De acordo o Manual de Limpeza e Controle de Infecção do fabricante do alcoolímetro, ao ser efetuado o teste, fluidos corporais e outras substâncias excretadas são transportadas por gotículas aerossolizadas, depositadas no bocal de sopro e no instrumento de bafômetro, podendo servir para a transmissão da COVID-19 e de outros vírus transmissores de doenças. (REF: Infection Control Cleaning and Disinfecting Intoximeters Handheld Instruments.5, 1 of 19, REV 5, MRF, 12/07/2020)
Como forma de proporcionar mais segurança, foi recomendada pelo fabricante a utilização de uma capa de silicone, que deve ser trocada a cada medição, além de desinfecção do aparelho com pano e solução de álcool isopropílico 70, o qual não deveria ser reutilizado por pelo menos 2 horas. (REF: MANUAL COVID-19 – RECOMENDAÇÃO PARA HIGIENIZAÇÃO DE ETILÔMETROS ALCOLIZER MOD LE5).
No entanto, os órgãos de trânsito não possuem capas protetoras sobressalentes para troca e higienização a cada medição. Do mesmo modo, não possuem aparelhos em quantidade suficiente para deixá-los sem uso por 2 horas. Na prática, sabemos o mesmo aparelho que realizou o teste no primeiro condutor abordado, também será utilizado para a realização dos testes de todos os condutores subsequentes, sem seguir qualquer protocolo de higienização ou norma de segurança.
Nem se fale, ademais, na necessidade de remover a máscara facial de proteção para realização do teste, o que causa grande insegurança e receio de contaminação para o condutor abordado. Sobre o tema, por meio do Decreto Estadual 64959, de 04 de maio de 2020, o Governo Estadual tornou obrigatório o uso adequado de máscaras nos espaços públicos, sob pena de multa.
No próprio portal eletrônico do Governo do Estado de São Paulo está expressa a previsão de imposição de multa de R$ 524,59 ao cidadão em situação irregular, isto é, sem máscara de proteção cobrindo corretamente nariz e boca.
Diante disso, se mostra LEGÍTIMA a recusa do condutor em se submeter ao teste do bafômetro, lembrando que o agente de trânsito tem ao seu dispor outros meios para certificar a ingestão de álcool, como o exame clínico e a colheita de sangue, mas a realidade é que não se utilizam desses recursos, tornando a autuação nula também por essa razão.
Portanto, seja porque o condutor não efetuou o teste do bafômetro pela falta de segurança no que tange ao risco de transmissão do covid-19, seja porque o agente de trânsito não certificou a ingestão de álcool por outros meios disponíveis, a nulidade da multa é medida que se impõe, sendo imprescindível a interposição de recurso administrativo e até mesmo propositura de ação judicial.